O TAO DO
CORPO
O homem
deste fim de século caminha rumo à sua essência, resgatando verdades simples e
universais como a harmonização com a vida através do respeito a todos os seres
vivos e a si próprio, é o despertar de uma consciência da Unidade, para
compreender que tudo está ligado, pulsando no ritmo da sincronia universal.
A
dualidade cartesiana dá lugar à Unidade, ao entendimento de que não existe a
energia do Bem e do Mal com seus desmembramentos, mas sim Energia Una, Toda,
Total, Indivisível, porém Mutável. A constante mutação desta Energia Única gera
movimento, que gera vida, em todas as suas formas e facetas.
O Tao, na
concepção chinesa é o próprio movimento da vida – “O desenho do Caos
Maravilhoso e do caminho, o trajeto do nascimento, crescimento, amadurecimento,
decrepitude, morte, vazio recomeço perpétuo, alternância de Yin e Yang” (Tao
the King, livro milenar de sabedoria chinesa).
O Tao do Corpo
Seguindo a trilha do pensamento da Unidade, somos levados
a pensar no corpo como uma entidade composta de matéria, sentimentos, sensações
e alma, que devem ser trabalhados em todos estes aspectos que o envolvem; um
treinamento corporal somente físico gera “Rambos”, corpos trabalhados somente
no exterior, porém afastados de ser interno. Os treinamentos excessivamente
teóricos e psicológicos por sua vez geram mentes enormes, sem um alicerce
físico que as sustentem.
O
trabalho no corpo deve ampliar o potencial humano de um ser como um todo; sua
forma física, sua beleza estética e interior, seu potencial criativo, orgânico,
sua capacidade de amar e de iluminar-se. Em última análise, devemos aprender as
leis que regem o Tao universal, as mesmas leis do Tao do Corpo, porque somos
uns Microcosmos que funciona igual ao Macrocosmo no qual estamos inseridos.
Deus é Musculatura
Kasuo Ohno, mestre da dança Butoh japonesa diz que
nosso corpo é composto de 5 musculaturas, que devem ser conscientizadas e
trabalhadas. Cada musculatura tem suas regras e leis próprias, embora se
interdependam.
1a
Musculatura – É o corpo físico propriamente dito, o corpo que pode ser visto,
tocado, o limiar entre o nosso interior e o nosso exterior.
2a
Musculatura – É o corpo físico da pele para dentro; nossos órgãos, sangue,
células, e todos os movimentos que se processam no interior físico de nosso
corpo.
3a
Musculatura – É uma musculatura abstrata; é o corpo emocional, psíquico,
vibratório, mental, sensível, mediúnico.
4a
Musculatura – É a energia que contém o Tudo, a força da vida que circula em nós
e que nos mantém vivos. É a musculatura Essencial.
5a
Musculatura – É a musculatura de contato, é o outro, o mundo que nos cerca, o
meio ambiente, a sociedade, a troca.
O
processo de trabalho do corpo deve começar, portanto pela quarta musculatura,
para contatar com aquela energia essencial, divina, que reina no interior de
cada um de nós. Este trabalho é chamado meditação.
10 mandamentos básicos para a boa postura e
alinhamento
1o – Ser vazio interiormente, e elevar a
força do “Tantien” ao cocuruto da cabeça.
O Tantien é o ponto de força que sustenta nossa
estrutura física, e que deve ser forte e ativado. Situa-se três dedos abaixo do
umbigo, numa linha reta. A cada inspiração, pressione o Tantien para dentro de
você, repetidamente. Este exercício deve ser feito sempre que você estiver sem
energia.
O ar é bombeado do ponto Tantien, e sobe passando
pelo umbigo que deve estar todo aberto como um sol; se alguma parte do umbigo
estiver fechada, ou colada é sinal de que você esta sentado em sua cintura.
Abra o umbigo todo, para isso você terá que subir seu corpo para cima, e se
deslocar na cintura. Sinta a força que lhe puxa para cima a partir do Tantien,
e outra que crava seus pés no chão, dando apoio para a subida.
2o – “Encolher ligeiramente o peito,
esticando as costas por trás. O cocuruto da cabeça deve estar paralelo ao céu”.
Sinta as costas, normalmente a tensão faz dois montes em torno da coluna
vertebral. Inspire e mande ar para os montes das costas, apague-os, cresça por
trás, deixe o pescoço ereto; o cocuruto quer o céu.
3o – Afrouxar a cintura – gire
repetidamente seu corpo de um lado para o outro, sem travar o movimento. Sinta
que seu corpo pode dobrar e girar.
4o – Distinguir cheio de vazio – esta é
uma lei muito importante a ser observada em nosso cotidiano. É a transferência
total do peso do corpo de um pé para o outro a cada passo. Observe seu caminhar
e transfira seu peso todo a cada passo. Não deixe parte de seu peso na perna de
trás quando o movimento de impulso é com a perna da frente.
5o – “Baixar os ombros, deixar cair os
cotovelos”.
Quando o ponto Tantien não é forte o suficiente, a
tensão sobe para os ombros e pescoço. Inconscientemente, tentamos manter a
postura ereta colocando força na parte superior do corpo, quando na verdade, o
movimento é exatamente o oposto. Os chineses dizem que “o corpo é ferro sob
algodão”. A parte inferior, região visceral deve ser o alicerce de ferro, e da
cintura para cima devemos ser leves e fluidos como o algodão.
6o – “Em lugar de força muscular, usar
sabedoria para comandar os movimentos”. Esta frase é bastante abstrata, mas
fala de uma atitude interna que devemos desenvolver em nós. Esta atitude começa
na apreensão das regras corporais, e na vigilância cotidiana desta postura
harmônica. Não adianta ficar ereto somente quando fazemos exercícios. Esta
consciência deve ser constante em nosso cotidiano para que haja uma mudança real
em nossas atitudes corporais. Jesus Cristo dizia “orai e vigiai” em referência
a esta atitude interior de “serenidade com atenção”, a atitude do guerreiro
marcial, do sábio, do homem consciente.
7o
– “Ligar Alto e Baixo” – os pés movem-se juntos com as mãos e os olhos, à parte
de cima do corpo movem-se junto com a de baixo. A tensão social, o pensamento
facetado, a separação corpo mente
espírito nos levou a ter atitudes corporais também divididas. É necessário
imprimir fisicamente este conceito de Unidade, para estarmos inteiros também no
corpo. Muitas vezes olhamos só com os olhos para uma direção, enquanto que
nossos joelhos e pernas vão à direção oposta, nossa mente divaga em outra
situação que não é aquela que estamos vivendo, e assim nos tornamos um circo
louco de impulsos desconexos.
Estar
aqui e agora totalmente, com todas as partes do ser e do corpo. Se olho para o
lado, todo o meu ser olha para o lado, e assim por diante. Procurar levar todo
o corpo em cada ação física que desempenhamos.
8o
– “Unir interior e exterior – abertura e fechamento dos pés e mãos correspondem
à abertura e fechamento do espírito”.
Corpos
fechados correspondem a espíritos fechados. Quando existe o trabalho interior
de fluir com vida, ser maleável e aberto interiormente, automaticamente esta
atitude começa a se imprimir no corpo físico, de dentro para fora.
9o
– “Ligar movimentos sem interrupção” – novamente uma atitude de fluidez, não
viver “aos trancos e barrancos”, mas soltar-se e transformar-se de acordo com
as situações que a vida nos apresentar; ser macio.
10o
– “Manter a calma interna durante o movimento”.
Ao
praticar exercícios físicos devemos se capazes de reter o calor interno que o
exercício provoca, acalmando os batimentos cardíacos para que não ocorra stress
muscular.
Maria Pia
Coreógrafa e terapeuta
corporal
Extraído
de Cadernos de
Teatro 131
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